Jorge Franco
“Sentado ao lado do grande homem, Harry ruminava
pensamentos sobre os escritores que crescera adorando. Forster, fazendo em
pedaços o colonialismo, absurdo dos absurdos; um Orwell sério; Graham Greene,
errático, correndo atrás de encrenca e de morte; Evelyn Waugh, que via quase
tudo, e odiava o que via. Mamoon era um dos últimos desse tipo, e de mérito
equiparável, na opinião de Harry. E Harry estava na casa dele; andava a seu
lado e discutia a sério com ele; ia escrever sobre a vida dele. Seus nomes ficariam
unidos para sempre; ele teria uma diminuta fatia do poder do velho. Mas a
biografia havia aprendido muito com a imprensa de escândalos; tinha sido sugada
na direção da imundície, um processo de perda de qualquer ilusão. Desmascarar
era o grande lance, deixando apenas ossos nus. Você acha que gosta desse
escritor? Pois veja como ele maltratou a esposa, os filhos e a amante. Ele até
gostava de homens! Tenha ódio dele, tenha ódio de sua obra — de qualquer lado
que a gente olhe o sujeito, está tudo acabado. A questão agora era outra: o que
podemos perdoar nos outros? Até onde eles podem ir antes que a nossa fé neles
vire pó?”
(Hanif Kureishi, no livro A última palavra)
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