segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Boa parte da mitologia...

“Boa parte da mitologia que se desenvolve em torno de cada uma dessas doutrinas, desde suas liturgias até as normas e os tabus, deriva da burocracia que vai se gerando à medida que evoluem e não do suposto fato sobrenatural que lhes deu origem. A maior parte das narrativas simples e pacíficas, mistura de senso comum e folclore, e toda a carga beligerante que desenvolvem derivam de uma interpretação posterior desses princípios, quando não tendem a se deturpar, por parte de seus administradores. O aspecto administrativo e hierárquico parece um ponto-chave em sua evolução. No princípio, a verdade é revelada a todos os homens, mas rapidamente surgem alguns indivíduos que se atribuem o poder e o dever de interpretar, administrar e, caso necessário, alterar essa verdade em nome do bem comum e, para isso, estabelecem uma organização poderosa e potencialmente repressiva. Esse fenômeno, que a biologia mostra que é próprio de qualquer grupo animal social, logo transforma a doutrina num elemento de controle e de luta política. Divisões, guerras e desavenças tornam-se inevitáveis. Cedo ou tarde, a palavra se faz carne e a carne sangra.”

(O Jogo do Anjo, Carlos Ruíz Zafón)

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